Na busca de uma educação que traga a população indígena como protagonistas da história do Brasil, conversamos com Diana Sales Ferreira, uma das autoras do projeto Tem Cor no Ensino
Dia 19 de abril é o Dia dos Povos Indígenas ou Dia da Resistência Indígena, um dia de conscientização da luta e história da população indígena no Brasil. Há mais de 305 povos/etnias indígenas e pelo menos 274 línguas, segundo o Censo do IBGE de 2010 ( o mais recente). No entanto, devido ao genocídio contra essa população, que continua até os dias atuais, temos pouco contato e informação sobre os povos originários, aqueles que foram os primeiros brasileiros. Para diminuir essa lacuna, principalmente na educação, o projeto “Tem Cor no Ensino”, lançou esse mês um material didático gratuito, principalmente para professores, trabalharem a história e cultura indígena nas escolas.
O projeto foi idealizado pela historiadora e professora Keilla Vila Flor, que em novembro de 2020 lançou o primeiro material do projeto focado na história da população negra. Desta vez, durante o abril indígena, o foco foi a população indígena. O material conta com uma cartilha, propostas de atividades, uma HQ, um calendário de lutas indígenas e um vídeo. Apesar de ser focado no ensino das escolas, todas as pessoas podem ter acesso a esse conteúdo. Informação e conhecimento são essenciais para todes! É possível baixar os materiais no link.
“Buscamos a quebra de estereótipos existentes sobre a população indígena nas escolas, principalmente o ‘Dia do Indio’, que não é abordado como deveria ser. É abordado de forma superficial, as crianças são pintadas com grafismos e usam cocar, mas não explicam a luta, a cultura e a história da população indígena. O material explica muito bem isso. Queremos mostrar como os professores podem trabalhar a pluralidade indígena no Brasil”, conta Diana Sales Ferreira, indígena do povo Tapeba, graduanda em história na UnB e uma das autoras do material sobre abril indígena.
Apesar da lei 11.645/08, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena, sabemos que isso está muito longe da realidade educacional no país. Ainda aprendemos muito pouco sobre a população indígena nas escolas e nossos professores têm pouco acesso ao tema durante a graduação. Diana destaca que essa iniciativa tem como objetivo a quebra de paradigmas sobre a história indígena e pontua a importância de recuperarmos a história e cultura indígena no ensino de história .
“O meu objetivo de está cursando História é mostrar que somos sujeitos da nossa própria história, que o estudo da história é um contínuo exercício de alteridade. Os fatos históricos, por contarem com diversos agentes para sua formação, ocorre mediante diversas perspectivas, não há uma história única ou universalizante, mas histórias múltiplas e fragmentadas. Contudo, sabemos que, dentro dessas concepções, há aquelas que exercem maior hegemonia e poder sobre as demais que faz questionar sobre a interseccionalidade e a descolonização dentro do campo da história. O HQ e a cartinha trabalham bem estes aspectos fazendo refletir e questionar sobre as comunidades indígena”, conta.
O alcance dessa iniciativa superou todas as expectativas. Só na divulgação inicial do projeto, mais de 10 mil professores inscritos, de todos os Estados do Brasil e cerca de 1.355 alunos atingidos. “Passar isso para a população não-indígena é importante. Temos histórias e somos protagonistas. Como dizemos no material, não é o dia do índio, todos os dias são dos povos indígenas lutando para resgatar a nossa cultura.. Além disso, queremos mostrar para outras pessoas indígenas que não estão sozinhas, que estamos juntos”, pontua a graduanda em história.
Diana lembra uma música de sua comunidade que diz:
“quem deu esse nó não soube dá/
quem deu esse nó não soube dá/
esse nó está dado e eu desato já/
eu desenrolo essa corrente/
deixa os índios trabalhar”
Para ela, a população indígena tem que desatar vários nós, que são as barreiras que existem. ““O nó do preconceito, da demarcação das nossas terras e da nossa cultura. Vamos desatar e trabalhar todo dia para desenrolar esses nós que querem nos prender, mas só conseguimos desatar juntos.Eu tinha com relação a minha própria identidade indígena e eu fui desatando ao longo do tempo. Esse nós vamos desatando juntos, somos uma comunidade e parentes com o mesmo intuito e objetivo”, finaliza.
Vitória Régia tem 24 anos, é formada em jornalismo e acredita no poder da comunicação para mudança social. É nordestina de nascimento, paulista de criação e carioca por opção. É apaixonada pela arte de contar histórias e dedica a vida a militância nos movimentos feminista, negro e LGBT.